Mulheres indígenas e de comunidades rurais isoladas expressam interesse em usar tecnologia geoespacial para proteger florestas comunitárias na Amazônia brasileira.

A Rede Origens Brasil® facilitada e administrada pelo Imaflora, conecta produtores comunitários que vivem em Territórios (corredores de áreas protegidas) na Amazônia, extenso e diversificado em termos de produtos e povos que os habitam, com o mercado consumidor a fim de promover relações comerciais éticas que valorizem a produção que mantém a floresta em pé.

As pessoas e comunidades que formam a rede Origens Brasil® são um grupo de usuários-alvo do TerraOnTrack, um aplicativo que está sendo desenvolvido em parceria com o SERVIR-Amazônia. O aplicativo permitirá que comunidades tradicionais e povos indígenas identifiquem rapidamente ameaças potenciais aos seus territórios e monitorem atividades ilegais, o que, por sua vez, aumentará a proteção florestal e a capacidade de gestão territorial.

O TerraOnTrack também beneficiará fortemente o sistema de monitoramento da rede Origens Brasil® que o Imaflora administra há três anos. TerraOnTrack pode tornar o sistema de monitoramento muito mais ágil. Atualmente, a coleta de dados ocorre por meio de um questionário. Os indicadores são recolhidos e respondidos pelos técnicos das instituições de apoio (que prestam apoio técnico, auxiliando no registo dos produtores, a medição dos bens e volumes produzidos), bem como pelos próprios produtores beneficiários e membros da rede.

O sistema de monitoramento busca, entre outros objetivos, avaliar o impacto da rede nas mulheres que a integram, por meio da coleta de informações sobre a produção, seus métodos de envolvimento na tomada de decisões e suas percepções sobre as mudanças que ocorrem com sua inserção na rede. Como participantes do atual sistema de monitoramento, as mulheres apontaram as possibilidades que o aplicativo TerraOnTrack traz para a identificação de ameaças às suas áreas de coleta de produtos, bem como localização, volumes de produtos e outras funcionalidades que podem ser desenvolvidas.

Potencialidades do aplicativo TerraOnTrack

As mulheres entrevistadas durante a apresentação da versão preliminar e consulta de usabilidade do aplicativo TerraOnTrack nas comunidades da região norte do Estado do Pará demonstraram muito interesse em aprender a usar o aplicativo. A consulta foi realizada em 2021 e contou com a participação de 10 mulheres de 2 comunidades rurais e indígenas. Embora a ferramenta seja voltada a identificar ameaças ao território, as mulheres viram ali uma oportunidade de mapear muitas outras ocorrências do seu dia a dia. Elas apontaram diferentes temas e áreas onde o aplicativo poderia ser utilizado, tais como, o tamanho, a localização e as condições ambientais e de conservação de suas áreas de coleta, os volumes de produtos, informações sobre a agricultura familiar dentro do território (número de famílias, produção e localização), mapeamento de doenças endêmicas, de equipamentos públicos de educação e saúde, de recursos naturais para uso turístico e localização de focos de uso de agroquímicos.

As novas funcionalidades estão sendo avaliadas para a versão 2.0 do aplicativo, a ideia é que ao menos uma dessas demandas seja incorporada, dada sua sintonia com os objetivos do TerraOnTrack.

No início de 2022, houve uma aproximação das chamadas “Comunidades de Prática” com o objetivo de fortalecer os grupos existentes de mulheres que utilizam ferramentas geoespaciais e incorporar as experiências desses grupos na representação de gênero no serviço TerraOnTrack. Dessa forma, foi contatado o grupo denominado “Meninas da Geo”, que trabalha com extensão do conhecimento científico e pesquisa em geotecnologias no estado do Pará. O grupo é formado por estudantes e docentes do Instituto Federal do Pará e da Universidade Federal Rural da Amazônia e já atua em comunidades rurais no Estado. A ideia é que os próximos encontros permitam identificar as sinergias entre os projetos do grupo e os desenvolvidos pelo Imaflora para que sejam gerados intercâmbios de experiências, transferência de capacidades e se avalie a viabilização de áreas para difusão do aplicativo TerraOnTrack focado em uma Comunidade de Prática.

Produtores, Estado Federal do Pará. Crédito: Imaflora

Gênero nos territórios de atuação da Rede Origens Brasil®

Na Rede Origens Brasil®, que atua em cinco territórios, Xingu, Calha Norte, Rio Negro, Solimões e Tupi Guaporé, as mulheres cadastradas totalizam 848. pessoas, representando 45% do total de indivíduos cadastrados. Deste total,104 mulheres são extrativistas (coletoras de castanha e outros produtos não-madeireiros), 661 indígenas e 83 quilombolas.

Entre as atividades produtivas que mais envolvem a participação de mulheres estão o artesanato, a castanha do Brasil, e a farinha de mandioca. O gráfico abaixo mostra o número de mulheres cadastradas como produtoras nos cinco territórios

 

Indicadores criados especificamente para as mulheres visam captar o nível de participação nas tomadas de decisão na comercialização dos produtos. Os dados mostram que, em sua maioria, 78%, as mulheres participam dessa decisão ainda que dessas, 39% tenham respondido que participam algumas vezes, como mostra o gráfico abaixo.

De acordo com Mariana Finotti, coordenadora de projetos do Imaflora/Origens Brasil®, os dados ainda estão sendo processados e serão analisados. Contudo, o processo de análise das informações já permite extrair percepções com base no acompanhamento de algumas relações comercias. Por exemplo, é visível a satisfação das mulheres indígenas ao verem seu artesanato valorizado, transformado em bolsas, calçados, luminárias.

Por outro lado, a participação  das mulheres na coleta da castanha acaba sendo ocultada, seja pelo fato da produção ser vendida em nome do homem , seja porque ela realiza atividades que não são contabilizadas na produção, como a quebra das castanhas e os cuidados com a alimentação e com as crianças, já que a coleta de castanha envolve a ida para a floresta e participação de toda a família.

Identificamos ainda uma baixa participação das mulheres nas capacitações do Origens Brasil®. Como já foi dito, a língua pode ser um fator, todavia, a maior participação de mulheres jovens nas capacitações da Calha Norte, pode indicar motivos voltados às responsabilidades das mulheres mais velhas ou casadas com afazeres da casa e dos filhos.

Essas percepções preliminares sinalizam, desde já, a existência de possibilidades de melhorias na abordagem de forma que se possa ampliar a participação das mulheres seja na aplicação da ferramenta, seja na produção e nos espaços de participação e tomada de decisão.  Com os resultados sistematizados, cabe aos membros da rede, aprofundar a análise para que sejam avaliadas as melhorias necessárias e sua implementação.